Vladimir
Putin participou na sessão plenária da reunião do 15º aniversário do Clube
Internacional de Debates Valdai.
18 de Outubro de 2018
17:50
Sochi
O
tema principal é O Mundo Em Que Viveremos: Estabilidade e Desenvolvimento no
Século XXI. O moderador da sessão plenária é Fyodor Lukyanov, Director de
Pesquisa da Fundação para o Desenvolvimento e Apoio, do Clube de Debates
Valdai.
O
Fórum Valdai abriu em Sochi, em 15 de Outubro. Os participantes - 130
especialistas de 33 países - estão discutindo as perspectivas políticas e
socio-económicas da Rússia, bem como o desenvolvimento social e cultural e o seu
lugar no mundo moderno.
O
Club Valdai foi fundado em 2004. Tradicionalmente, os participantes do fórum
reúnem-se com altos funcionários da Rússia, que fazem parte das reuniões
anuais.
* * *
Reunião
do Clube Internacional de Debates Valdai
Fyodor Lukyanov, moderador da
sessão plenária : Boa tarde, Amigos,
Vamos
começar a nossa sessão final. De acordo com a tradição, temos aqui o Presidente
da Rússia, Vladimir Putin, como nosso convidado.
Senhor
Presidente, caso se tenha esquecido, está aqui pela 15ª vez. Como está?
Presidente da Rússia, Vladimir
Putin: Em primeiro lugar, gostaria de falar com os participantes
permanentes da nossa reunião. É verdade, 15 anos já é alguma coisa. Acredito
que o Clube Valdai, como o chamamos, porque os primeiros eventos ocorreram em
Novgorod, se tornou uma boa plataforma internacional ao longo destes anos, uma
plataforma para profissionais interessados em política global, economia,
cultura e trabalho da comunicação mediática (br. Mídia). Claro que, em relação
à Rússia.
Em
regra, são peritos sobre assuntos da Rússia. E gostaríamos muito que as pessoas
que trabalham com a Rússia tivessem tal plataforma, para pudermos encontrar-nos
e puderem ouvir a nossa posição sobre todos os assuntos de interesse para vós,
para os vossos países e para nós, para a Rússia, não através de interpostas pessoas,
mas em primeira mão, de mim e dos meus colegas.
Estas
discussões apresentaram sempre pontos de vista diferentes e, às vezes, mesmo
opostos. Penso que é essa, a vantagem deste clube de debates; designamos como
clube de debates, porque onde há apenas um ponto de vista correcto, não há
lugar para discussão.
A
verdade nasce da comparação de diferentes abordagens aos mesmos fenómenos e de várias avaliações. Graças à vossa participação, podemos atingir este resultado.
Vejo
muitos políticos mundialmente famosos nesta sala, aqui à minha direita e
gostaria de saudá-los a todos, incluindo o Presidente do Afeganistão e os
nossos colegas da EAEU. Também posso ver cientistas, figuras culturais e
jornalistas. Espero que a reunião de hoje não só seja útil, como também
interessante.
No
entanto, estou um pouco confuso sobre o formato de hoje. Normalmente, temos
várias pessoas neste palco e o debate demora algum tempo. É claro que estou
pronto para voar sozinho, como sugerem os organizadores, mas espero que não
demore quatro ou cinco vezes mais do que o habitual.
Obrigado
e vamos apenas pôr de lado os longos comentários de boas-vindas e vamos directos
para nossa conversa, para o nosso trabalho e para o nosso debate.
Fyodor Lukyanov: Senhor Presidente, é verdade que, como referiu,
Valdai tem vários pontos de vista. Sempre houve muitas opiniões e este ano não
é excepção.
Especialmente
quando vemos os nossos associados a expandir-se, não só em números, como também
em termos de representação de vários países e regiões, o que, obviamente,
proporciona visões diferentes.
Este
ano temos uma agenda muito ocupada com um assunto que não tem sido muito
característico para Valdai, recentemente, porque geralmente falamos praticamente
sobre a Rússia o tempo todo. A última vez que conversamos sobre a Rússia foi na
10ª reunião. E certamente está lembrado de que foi um evento muito grande; o
Sr. participou e decidimos voltar.
Não
só porque foi solicitado por muitos dos nossos participantes, membros do clube,
(Valdai preparou um relatório anual para esta sessão), mas também porque
acreditamos que o mundo está a enfrentar algumas mudanças muito graves.
Não
está só a ser transformado globalmente; mas, em certo sentido, estamos a perder
a visão sobre que fundações ele poderá ser construído mais tarde. Procuramos
esses fundamentos nos nossos relatórios anteriores, mas agora, de facto, nós
desistimos e podemos dizer que o momento em que a mudança do mundo poderia ser
controlada, passou.
Falaremos
deste assunto mais tarde, mas isto significa que qualquer país - grande ou
pequeno - acima de tudo, deve confiar em si mesmo, para organizar a sua própria
estabilidade e desenvolvimento. Por esta razão é que seria razoável considerar
se estamos preparados para isso. Neste sentido, é claro que, o que diz, é
realmente informação em primeira mão.
Infelizmente, o nosso trabalho
está ofuscado por um acontecimento trágico. Escutamos as notícias sobre Kerch.
Ontem, o Snr. falou sobre isso e nós também falamos sobre essa tragédia.
Qual
é o motivo principal? É claro que o primeiro pensamento de todos nós aqui - ou
de todos, em qualquer parte – é que se tratava de um grande ataque terrorista novamente.
Infelizmente, estamos a acostumar-nos a isso. Mas mais tarde, descobriu-se que
a situação era um pouco diferente.
Por
que é que esta recordação está a vir de novo para mim? Não é apenas porque isto
aconteceu, mas porque também traz lembranças do primeiro Fórum Valdai, em
Novgorod. O Snr. mencionou-o; ocorreu no contexto da tragédia de Beslan.
Participei
nesse fórum como também, muitos dos que estão hoje aqui connosco. Lembro-me muito
bem. Obviamente, o debate desorganizado, pois todos saíam para ver o que estava
a acontecer na televisão, pois não havia smartphones.
O
Snr. também estava em Valdai, mas durante o fórum, gravou um discurso difundido
pela TV para a nação que , compreensivelmente, foi chocante dado o contexto.
No
discurso, disse algo que seria citado mais tarde: “Os fracos são
espancados. Alguns gostariam de cortar um pedaço grande da nossa torta. Outros
estão a ajudá-los. Pensam que a Rússia, uma das maiores potências nucleares,
ainda é uma ameaça que deve ser eliminada. O terrorismo é apenas uma ferramenta
que eles usam ”.
Depois,
quando conversou com os membros do Clube Valdai, disse que havíamos sido
desafiados e que ultrapassaríamos esse desafio. Decorridos 15 anos; pensa que
conseguimos?
Vladimir
Putin: Foi uma longa declaração de abertura. Começou por declarar: “a última
vez, durante o 10º Fórum Valdai; foi o 14º Fórum Valdai ”(Risos).
Fyodor
Lukyanov: É melhor do que eu em matemática.
Vladimir
Putin: Sou um ouvinte mais atento.
Gostaria
de começar como você fez, de facto, com a tragédia de ontem. Paradoxalmente, entre
outras coisas, parece ser o resultado da globalização. Temos visto comunidades
inteiras na internet surgirem após eventos trágicos bem conhecidos nas escolas
dos EUA. Jovens psicologicamente
instáveis começam a acreditar em falsos heróis.
Significa
que nós, na Rússia e globalmente, não estamos a responder às mudanças no mundo.
Revela que não estamos a criar conceitos úteis, interessantes e essenciais para
os jovens, e eles recorrem a esse heroísmo suplente que conduz a tragédias como
esta.
Existe
uma procura pelo verdadeiro heroísmo nas nossas vidas. O verdadeiro heroísmo
pode manifestar-se, em particular, ao defender a civilização dos males de hoje.
É claro que o terrorismo é um dos males mais sérios e desafiadores. Já disse
muitas vezes, inclusive na 70ª sessão [da Assembleia Geral da ONU] em Nova
York, que a única maneira de, efectivamente, enfrentar o terrorismo é unir
esforços.
Infelizmente,
no verdadeiro sentido da palavra, ainda não estabelecemos essa cooperação.
Existem alguns aspectos de cooperação em que fomos bem-sucedidos, mas não é
suficiente. Pelos mais altos padrões, não conseguimos até agora, unir esforços
da maneira que devíamos, se bem que poderia ter sido feito, baseado nas Leis relevantes
do Direito Internacional e nas resoluções da ONU.
Vou
tentar dar uma resposta directa à sua pergunta: “Alcançamos os resultados que
esperávamos atingir, começando com os acontecimentos tristes e trágicos que
testemunhámos ou em que participámos, em meados da década de 1990 e no início
dos anos 2000?"
De
uma maneira geral, claro que sim. Recordemos que - tendemos a esquecer muito
rapidamente os erros cometidos contra nós, tentando pensar apenas em coisas
positivas - na época estava a ocorrer na Rússia, uma guerra civil. Não foi uma
guerra global e não envolveu todo o país, mas houve hostilidades, uma
verdadeira guerra.
Guerra
com intervenção da aviação e de equipamentos militares etc., um grande número
de grupos militantes no território deste país, com militantes provenientes
principalmente de organizações terroristas sediadas no estrangeiro, incluindo a
Al-Qaeda, que estavam activos neste país.
Graças
a Deus, livrámo-nos deles, mas não erradicamos o terrorismo em si. É claro que
o terrorismo ainda representa uma grande ameaça para o nosso país e foi por esse
motivo que lançamos estas operações na Síria.
O
terrorismo é uma grande ameaça para os nossos vizinhos, incluindo o Afeganistão
- vejo o Presidente [Hamid] Karzai aqui. Se lhe for dada a palavra, ele dir-nos-á
o que está a acontecer, hoje, no seu país - e também é uma grave ameaça. Quero
dizer que não derrotamos o terrorismo globalmente, é claro, mas demos-lhe um
tremendo golpe e claro que mudamos drasticamente a situação no nosso país - na
Federação Russa - para melhor.
Fyodor Lukyanov: O Snr. está naturalmente a inferir uma reminiscência diferente. A conferência de
Valdai de há três (em 2015) ocorreu exactamente, duas semanas após o início da
operação militar na Síria.
Recordo-me
que um de nossos colegas fez uma pergunta: “Vale a pena realmente estar
envolvido? Por causa dos custos, das baixas, e não está claro como é que vai
acabar.” E o Snr. disse a sua frase sui generis, que foi citada muito mais
tarde:“ Há cinquenta anos, aprendi uma regra nas ruas de Leninegrado: se a luta
for inevitável, sê o primeiro a atacar ”.
Bem,
atacámos e, três anos depois, a situação na Síria realmente mudou
drasticamente, mas ainda é impossível dizer que o problema foi resolvido.
Acontecimentos recentes produzem impressões positivas e negativas. Por esta
razão, gostaria de repetir a pergunta de há três anos: “Talvez não valesse a
pena o risco, porque as baixas foram preocupantes?”
Vladimir Putin: Lembro
dessa pergunta, mas soou como “As baixas serão possíveis?” Então eu disse:
“Sim, são, mas devemos evitar o pior curso dos acontecimentos.” E qual seria o pior
desenvolvimento para nós? A completa “somalização” daquela região, a degradação
do Estado e a infiltração de uma parte significativa dos militantes no território
da Federação Russa e no território dos Estados vizinhos com os quais não temos
barreiras alfandegárias ou fronteiras de facto, nem necessidade de apresentação
de visas ou passaportes. Para nós, representaria um perigo real e sério.
Mas,
eliminamos em grande parte, esse risco através das nossas acções, porque
causamos muitos danos aos terroristas na Síria. Muitos deles foram eliminados,
e alguns deles, graças a Deus, decidiram que queriam sair: eles depuseram as
armas após perderem a fé nos princípios que consideravam correctos. Eu diria,
que este é o resultado mais importante.
A
segunda e não menos importante consequência, é que preservamos o Estado sírio
e, nesse sentido, ajudamos a estabilizar a região. Falámos sobre esse assunto, ontem,
com algum detalhe, com o Presidente do Egipto; ele partilha essa posição e é
partilhada por muitos outros países. Portanto, acredito que, de um modo geral,
alcançamos as metas que estabelecemos para iniciar a operação na República
Árabe da Síria; nós conseguimos um resultado.
Veja,
afinal de contas, alguns anos antes de nós, os países que concordaram em
participar nessas operações anti-terroristas, na maioria das vezes
voluntariamente, e talvez até mesmo com metas e objectivos menos perfeitos -
que resultado vimos nos três anos anteriores? Nenhum. Enquanto nós libertamos
quase 95% de todo o território da República da Síria. Este é meu primeiro
ponto.
Segundo.
Apoiámos o Estado da Síria, impedindo o Estado de entrar em colapso. É verdade
que ainda há muitos problemas. Agora vemos o que está a acontecer na margem
esquerda do Eufrates. Provavelmente, os nossos colegas sabem: este território
está sob o patrocínio dos nossos parceiros americanos. Eles confiam nas forças
armadas curdas.
Mas deixaram, claramente, uma ponta
solta: o ISIS permanece em vários locais e, recentemente, começou a expandir a
sua área de influência. Levaram 130 famílias como reféns - quase 700 pessoas.
Penso que poucos dos que estão aqui presentes, sabem que eles fizeram ultimatos, prorrogaram exigências e avisaram que
se esses ultimatos não fossem cumpridos, matariam 10 pessoas todos os dias.
Anteontem, 10 pessoas foram baleadas. Executadas. Eles começaram a cumprir as
suas ameaças.
Isto é simplesmente horroroso. É
uma tragédia. Precisamos fazer alguma coisa. Por que razão é que os nossos
colegas se mantém em silêncio? Segundo as nossas informações, estão entre os
reféns, vários cidadãos americanos e europeus.
Estão todos calados, está tudo
em silêncio como se nada estivesse a acontecer. Portanto, ainda há muito a ser
feito; isso é verdade. Mas repito que, no geral, alcançamos o nosso objectivo.
O próximo passo é um acordo
político na ONU, em Genebra. Precisamos formar agora uma comissão
constitucional. O progresso não é fácil, mas ainda estamos a avançar. Espero
que possamos avançar com os nossos parceiros nesta área.
Fyodor Lukyanov: O Snr.
disse que alguns dos militantes perderam a fé e compreenderam que estavam
errados. Primeiro, tem a certeza de que eles perderam a fé? Ou talvez eles estivessem
apenas dominados e percebessem que era inútil continuar a lutar, mas a situação
poderia mudar um pouco e eles teriam a fé de volta?
Vladimir
Putin: Talvez. Talvez sim. Provavelmente,
tem parcialmente razão.
Alguns deles, na verdade,
depuseram as armas e, realmente, perceberam que tinham objectivos falsos.
Outros aproveitaram-se, simplesmente, das nossas medidas humanitárias por
enquanto e estão prontos para pegar nas armas a qualquer momento. Isso é
possível.
Isso significa simplesmente que
todos nós precisamos de estar alerta, não subestimar as ameaças e intensificar o nosso
trabalho conjunto para combater o terrorismo, a ideologia do terrorismo e o
financiamento do terrorismo.
A continuar.
Tradutora: Maria Luísa de Vasconcellos
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